Oi, Vicente Comecei a te escrever no dia 23 de outubro. Para te dizer: bem-vindo! Como padrinho, te deixo um registro on-line A ti, que…
Memória
A categoria MEMÓRIA organiza todos os posts que tiveram sua efêmera serventia em algum dos blogs, servindo apenas como memória interna.
Não vale a pena ser veiculado no lpedrosa.com.
Pensador anônimo
Era uma noite escura e tempestuosa em Budapeste. (Escrito em 2018 após uma visita a estátua Anonymus Szobor) No terminar do passeio, às vésperas da…
A Menina Mágica: 5 – O sumiço
Encostado no canto do banheiro, Geison cochilava mais do que de costume. Já não dormia à noite e, quando fechava os olhos, via Mel sem…
Menina Mágica: 4 – A sala do terror
Tem coisa que não funciona mais em circo. Um elefante no meio de uma tenda até pode alegrar momentaneamente a criançada e adultos, mas um animal acorrentado faz a alma sofrer por muito tempo.
Tem coisa que não deveria mais funcionar em shopping. No comércio, onde a alma é fazer negócio, montar uma sala do terror com bonecos alienígenas, muita fumaça, pouca luz e alguns sustos prontos podem até assustar, mas apenas vendem a frustração permanente de um terror mal feito. Como mesmo assim gerava dinheiro, o shopping tinha reservado uma ala bem grande para esta instalação temporária.
Menina Mágica: 3 – Encontro
A bandeja sobre o bufê era acompanhada por uma mão e uma tatuagem com os quatro naipes de um baralho. Pintadas cuidadosamente com canetinha, durariam, no máximo, uns 30 minutos. Tempo suficiente para que ela pudesse se servir e mastigar delicadamente os itens escolhidos no restaurante chinês.
Havia, naquele estabelecimento, o poder da proporção. O que antes custava 80 reais o quilo era servido até por um quarto do preço aos trabalhadores do shopping. O desconto era progressivo. A partir das 13 horas, diminuía-se um quarto do valor. Quando o relógio apontava 14 horas, a calculadora subtraía 50%.
Mas a verdadeira alegria acontecia quando o ponteiro dava 15 horas. A menina se aproveitava do descontão oferecido. Em fim de festa, sem muitas opções e com várias outras já expostas em demasia, servir-se era um ato de coragem, astúcia e determinação. E ela o fazia bem.
A Menina Mágica: 2 – Luvas Azuis
Os seus cabelos esvoaçantes e ruivos surgiram em meio à praça de alimentação, bem próximos do restaurante chinês. Perto dali, um garoto da limpeza ficou impressionado com aquela cor de aurora.
Negro e pobre, pensava que outras cores e vidas distintas da sua eram de um luxo tamanho iguais ao fato de alguém poder almoçar comida oriental às 15 horas. Um sonho que poderia ter se as coisas melhorassem um dia para a sua humilde família.
Ele chegou a trabalhar com seu pai como servente aos 12 anos. Acidentado aos 15, quebrou o calcanhar em uma dessas obras de improviso. Pinado tardiamente, teve que se acostumar com o jeito manco de levar a vida. Mais
A Menina Mágica: 1 – O Assovio
Neste shopping, tudo beira ao marasmo. Há lojas, pessoas e compras. Nos corredores, disputando espaço com bancos, pilastras e letreiros digitais, existe uma outra categoria de estabelecimento que se apresenta como a opção mais próxima do consumidor.
Nela, não é preciso entrar no recinto para olhar e sair sem pagar. Nessa invenção chamada quiosque, o balcão é feito para se debruçar e tocar objetos que, tão caros quanto em um loja normal, encantam por serem mais palpáveis aos frequentadores.
As estratégias para atrair a freguesia exigem um show a parte dos seus vendedores. Cada um à sua maneira, e sempre com pouca idade, oferecem seus serviços de marketing direto.
A moça de touca, por exemplo, convida mãe e filhos gordinhos a degustarem o polvilho doce, o casadinho e outras delícias feitas artesanalmente com muito açúcar industrial.
No expositor de camisetas, a estratégia está na identificação adolescente com as estampas de super-heróis. Na falta de poderes, vendem carapuças de morcego, de aranhas, de homens verdes e de alguns seres estelares.
Mas não se engane em ver beleza em tais quiosques. O apelo visual em tão pouco espaço ocorre porque as lojas em si possuem aluguéis mais caros e demandam maiores estoques e poder de convencimento. Nos estandes de venda, ao contrário, é possível contratar pequenos aprendizes a salários curtos e escalas injustas.
Na dúvida trabalhista, os donos argumentam que são apenas pequenos empreendedores em busca de um futuro próximo no qual poderão, se as vendas assim ajudarem, explorar novos vendedores por meio de gerentes. Nada mais gratificante do que terceirizar uma bronca.
Mas há quiosques que emanam sua própria magia ao público. Não se trata, porém, de encantos das bugigangas eletrônicas expostas ou das comidinhas grátis oferecidas para degustação. Trata-se de uma mágica sincera feita por quem tira da cartola o seu ganha pão. E é dela que se alimenta esta história de amor.
Bem-vindos a um conto de Romeu e Julieta sem famílias ricas, mas com as devidas pitadas de podridão que só o poder pode oferecer. É a história de um amor sincero ao trabalho, que independe de sua visibilidade social. Nada muito shakespeariano e com doses de romantismo delimitadas pelo horário comercial.
Afinal, a volta para casa é longa demais para outro sentimento que não o sono.